6.7.10

Mãe preta


Lizete era breves. Cozinheira e lenços coloridos. O que ganhava dividia em dois. Metade dela, metade dele. Todo mês Zé Roberto aparecia, almoçava, banhava e ia. Mas em setembro sumiu. Foram dois anos varrendo casa sem cantar até doutor descobrir. O filho morto estava preso. Voltou. Magro. Morreu de AIDS. Desde então ela acabou. Até tentou se distrair com crediários. Comprou eletrodomésticos e discos do RPM. Depois não queria mais receber. Ia para rua distribuir dinheiro para meninos jogarem fliperama. No máximo ria de filmes de terror ou da bobissa dos pombos. Teve feridas nas pernas. Atendeu o telefone e cuspiu sangue. Morreu de mãe. Deixou na cômoda meses de salário enrolados no lenço preto que ela só usava nos dias de festa.

7 comentários:

Caetano disse...

ela morreu pra (re)tornar mãe.
que texto lindo. delicadeza de despedida.

bonito mesmo.
não pare mais. a gente agradece

beijão

Anônimo disse...

rapaz, que foda!
tenha a impressão que eu só escrevo isso aqui, sempre... rsrsr

e valeu pelo comentário da faca. Achei que vc não fosse nunca lá me ler!

abraço

Tay Barreto disse...

que coisa linda e verdadeira! é assim mesmo que as coisas acontecem.

Daniel. disse...

flavim cumpadi, é dificil falaralguma coisa, as palavras são enigmáticas e falam demais assim como os silencios, morreu de mãe, disso não resta duvida e ja ia esquecendo: muito bom suas palavras, como vc mesmo disse, as estórias curtas são infinitamente superiores

Fernanda Fassarella disse...

não tem outro jeito: mãe é mãe, e você sabe bem definir isso.

obrigada por escrever outra vez. era preciso!

e obrigada pela visita! suas palavras me ajudaram a retomar.

um beijo!! continue por aqui!

Ana Aguiar disse...

mas que sutileza, estou lendo o máximo que puder por aqui, me agrada muito.
abraço

Paula Falcão disse...

"Morreu de mãe".

Que coisa linda, flávio!